segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Ser

Havia uma moça no mundo. Uma única moça como aquela que vi passar naquele dia específico e inidentificável no tempo. Sua aparência não é relevante, mal me lembro a cor de seus cabelos. Não consigo me esquecer, porém, de como seus pés caminhavam verdadeiramente pisando nas pedras do chão, sem medo de sentirem-nas incomodar. Jamais deixarei de me recordar da forma como suas mãos, com leveza, pareciam tomar o lugar do vento, armazenando-o nas palmas apenas para contrastar o frio com o quente. Sempre terei como pronta a maneira com a qual ela jogava seus cabelos para trás sem tirá-los por inteiro do rosto, somente para que a textura de sua natureza não atrapalhasse seu encontro com o ar. Cheguei a pensar que fosse cega ou surda. Mas não, seus olhos simultaneamente fugazes e irresolutos captavam todos os movimentos do mundo. Seus ouvidos absolutamente atentos gateavam os sons da rua. Não sorria, parecia encontrar-se num estado atordoado de absorção. Não parecia poder acreditar na existência de seu corpo, humano, frágil e rígido. Não preparou-se para existir, e quando se viu existindo, perdeu o controle. Estava, então, num descontrole totalmente harmônico e delicioso. Atônita, linda, única por ser ela mesma num mundo em que ninguém mais se era.

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