segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Sem previsão

Podia a idéia de ferver pensamentos não fazê-los evaporar, mas a mudança de tudo que flui me obriga a lutar contra o cansaço mental e espremer meus dedos do pé até que estralem. Poetizar, aqui, equivale a um cotonete; serve para limpar. 
Nossos esquisitismos trazem a desordem para dentro de casa, desordem essa que produz um efeito acumulativo: a vontade enlouquecedora de gritar cordas vocais fora. Cordas vocais não podem ser gritadas fora nem se o grito projetado for dotado de significância - e de fato, o é. A proximidade quase miscelânea entre os sentidos, então, se manifesta, obrigando-nos a recorrer ao ser expressivo que mora debaixo de nossas camas e nos atormenta incansavelmente.
Emocionalmente deficientes e aturdidos por natureza, somos, sem exceção, direcionados à parte que mais esfola nossos joelhos: os relacionamentos supostamente amorosos intra-seres humanos, uns piores que os outros. Tem-se, daí, baldes e mais baldes repletos de uma melosidade repetitiva, incômoda e exaustiva. Tanto me desagradam as manifestações da carne e gordurinhas estomacais que delas procuro me abster. Concentro minha antena das sensações nas mil e uma outras sensibilidades que os mundos carregam.
Sou, porém, ser humano, tão humano quanto pode um ser. Escorrego na sina do elas, eles, ele e ela, nós, eu e você, vocês.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Catalepsia patológica dos pseudônimos

Há tempos procuro por palavras sinceras debaixo das minhas inúmeras xícaras de café. Prefiro transfigurar minha covardia num menininho que não consegue dormir. O tic-tac da bomba prestes a explodir o mantém acordado, preso a sua inconveniente consciência. Vê as cores de sua parede parda virando ao contrário e dançando uma valsa colombiana magistrada por um piano desconhecido que parece tocar sozinho através de sua porta. Resolve sentar-se ao chão para ouvir pelas frestas. Arrepios que lhe percorrem a alma escondem suas certezas infantis. Tenta ignorar as vozes que estão sufocando o som do passado.

Estou em casa conversando com uma ausência importante e cozinhando sentimentos afogados pelo prazer do cérebro trabalhando. Assim que tomei em mãos meu caderno vermelho, um som misturou-se à música costumeira. Apaguei-a e juntei-me à porta, quando tomei a decisão de me purificar pela honestidade. O piano, vivo, comia minha alma, degustando-a. Um grupo de vozes sinistramente serenas e palmas descompassadas iniciou um ritual que libertava meu espírito de suas atuais verdades universais. Incompletência. Vazia de sentido, cheia de significado. 
A cerimônia continuou. Algo no desconhecimento das palavras pronunciadas me causava incômodo, como que por desafio ao ofício. Por outro lado, era como um mantra que quase neutralizava meus nãos e hipnotizava meus sentidos no balanço da cortina rosa. A necessidade de sentir-me concreta era, agora, maior que a necessidade de sentir meu corpo limpo. A confiança na branquidão me garante a presença intocável dos animais. É a única que me cabe, pois não caibo na humanidade. 
Não pretendo matar meus pseudônimos sem nome.