quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Rabiscos são palavras (e vice-versa). Meus rabiscos comprovam minha falta de abstração. O mundo não existe mais, e eu deixei minha arte naquela esquina mal iluminada. Só sei fazer curvas curtas demais.

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Não sou um Gato

Provido de achismos, ouso dizer que tudo que temos é essa tela rabiscada, cheia de pinceladas coloridas e despadronizadas. Digo também que dentro de nós não há espaço para guardá-la. Por conseguinte, somos criaturas dotadas de expressão. Não que as outras não sejam, mas nós, através de recursos infinitos, procuramos reproduzir nossa tela interior, diferentemente das almas menos coloridas e mais puras, seja isso bom, seja isso ruim. Precisamos de lápis, instrumentos musicais, todas as articulações que nossos corpos possuem, e, acima de tudo, palavras, mesmo que as tornemos aparentemente irrelevantes. Sendo no íntimo de um caderno secreto, sendo num megafone mobilizador de mentes eufóricas, nossas palavras pretendem nos traduzir, ou ao menos a metade traduzível de nós. Julgo-me escravo das palavras, não vivo mais sem o auxílio da concordância e coerência semânticas. Elas me ajudam a ser, com tudo que tenho direito, um emotivo e tumultuado humano.

Gato.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Piscar de olhos

Pegou papel e caneta apenas por costume, sem saber ao certo como organizá-los em seus dedos nervosos. Deveria escrever mais. Cinquenta e cinco boas produções e algumas epifanias simplesmente não eram o suficiente para suprir todos os seus pensamentos idiotas e a necessidade de pô-los para fora, nem que seja numa conversa íntima e audível consigo mesmo enquanto caminhava pelos parques da cidade. Se continuasse importunando aqueles que o amavam com conversas infinitas, opiniões pré-formadas e surdez passageira, acabaria sozinho ou mal querido. E isso, por mais que a ideia de transitar mundo afora a procura de sensações diferentes lhe parecesse o melhor jeito de aproveitar seu tempo em terra, era inadmissível para a saúde de seu coração fraco.
Com traços leves e sem forma definida, deu início a um parágrafo fulano. Mera introspecção psicológica. Ele era criação de Machado de Assis, um narrador não-confiável. Apesar de narrar com convicção, sabia que era descrido, pois nem ele mesmo acreditava em sua mente imaginativa. Seres humanos só fazem ideia de nada. Eles não sabem, e mesmo assim se auto-afirmam com a certeza de seu ego gigantesco. Que certeza? Estão todos errados e certos, verdade é um termo perigoso.
Parou. Veio, então, aquela sensação paradigmática de ser um grão de poeira cósmica e, simultaneamente, o Universo inteiro. Ele não podia simplesmente adaptar-se ao fato de que a realidade é vista através de lunetas individuais, e muito menos ao fato de que há total incerteza no fato ao qual este mesmo se dá. Ficou, é claro, confuso. Seria muito mais fácil ser um pintor abstrato, se encontrar com seus instintos animalescos. Pensar era muito complicado. Descansou a caneta, pesado. Deitou-se na cama, fechou os olhos e resolveu esquecer-se de sua consciência, só por alguns segundos. Não funcionou.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Coisas importantes demais se encerram em si mesmas.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Peça do fim da vida na Terra

Um dia haverá nada. Seres humanos gordinhos, engasgados de lixo prateadodouradoperoladobanhadoaseiláoque, cuspirão seu refluxo podre nas ninfas da floresta, que, afogadas, padecerão, matando consigo todo o ar de mistério e sintonia natural que preenchiam o planeta. Os gorduchos de sistema nervoso diferenciado fazem parte de algo muito maior que todos eles juntos (mesmo com tamanha obesidade e gorduras excessivas). Mas isso, por estarem ocupados mordendo suas coxinhas de carniça e com olhos brilhando refletidos nas vitrines, ignoraram. Foi um caso de suicídio coletivo relativamente acidental. E então houve nada.
A crosta que envolve energia pulsante tornou-se opaca sem seus fiapos coloridos que sempre flutuaram pela atmosfera e transitaram entre corpos vivos. Talvez alma alguma jamais retornasse ao teatro que cedeu palco a tal show de horrores e massacre de luzes.
Gordinhos magros metidos a sabidos diziam a gordinhos gordos que a Terra era diferente dos planetas X e Y porque nela havia água. Havia, é. X e Y também são teatros, distantes 20 quarteirões para longe. E se as peças neles representadas tiverem sido prévias da Peça do Fim da Vida na Terra? Essas bolotas voadoras imóveis do vácuo podem ter sido palcos de catarses inarráveis se todos os seus fiapos forem coloridos do mesmo modo que a coloração dos fiapos dos gordinhos humanos. Podem sim.
É sempre reconfortante pensar na transparência como uma realidade possível para mini-fiapos como eu. Não querer acreditar no fracasso do amor cósmico no palito de fósforo em expansão é iminente e espontâneo para que um dia meu filme tenha letrinhas subindo pela tela.

Inegável

Nunca fui controlado. Estímulos que me envolvam emocionalmente tocam a lua e o rio em mim. Pensar e agir não são opções viáveis, sou movido por reações espontâneas. Calmaria não é questão de escolha. Coisas maiores que minha consciência cercam meu umbigo e implodem, provocando alterações químicas por todo o organismo vivo. Sou muito dionisíaco. A cachoeira afoga a terra e a deixa instável. Quando almas que tocam a minha dependem da bioluminescência que emana de mim, eu decepciono. Perco as rédeas que nunca encontrei e fico frustrado por deixar o animal furioso correr para o abismo. Quero segurá-lo, não quero que ele morra, sei que vai morrer. Faço com que ele corra mais rápido, desfaleço. A culpa é toda da reação, agonia, reação. Espaçamento entre letras é insegurança e a inabilidade de conviver com ela. Gostaria de poder dormir.

Ser Humano.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Sem estação

Peças de roupas amarrotadas cobriam partes confusas de meu corpo confuso. Meu tato estava fresco, meu paladar saturado, minha visão cansada, minha audição musical, meu olfato sóbrio e todos os meus outros sentidos resolveram acordar. A certeza da efemeridade e o medo do apego combinaram-se ao frio do dia quente e à necessidade de rabiscar. Catando uns biscoitinhos na cozinha e desejando que fossem de doce, saí pela porta dos fundos para que ninguém me visse, pisando de leve na branquidão do jardim. Um piano silencioso acompanhava meus pensamentos estupidamente melancólicos. Sem poder tocar instrumentos imaginários para não parar o piano e com a consciência de que meu estômago estava se expandindo vagarosamente, ignorei o proibido e soltei meus cabelos cor de fogo para que arriscassem liberdade. Queria pensamentos inéditos, algo nunca antes imaginado, eu não tinha mais paciência para a pertinência dos outros seres humanos, por mais que a necessidade de qualquer um deles, naquele momento, fosse eminente para acalmar os cavalos de dentro de mim. A escuridão natural acalentava meus olhos pesados e minha cabeça cimentada. Entrei no grande bosque sem caminhos predefinidos e corri para dar as mãos à meu velho amigo vento, o ar que eu havia perdido e deveria tratar de encontrar. O sumiço de todos os animais (inexistentes, alimentados por minhas expectativas) me deixou nervosa, agitava e revoltada por ter de fazer coisas que não quero. Seu rosto me aparecia em todas as árvores, secretamente elas se transformavam em você e eu as abraçava como se fossem fruto de um encontro repentino no meio de uma noite sem estação. O não-saber de um futuro bonito e dramático estava estreando uma peça em mim. Com tinta branca, tomei nota da epifania do momento em meu caderninho mental: são fatores biológicos associados à costumes indevidos, e não anseios incontroláveis de uma alma eternamente colorida. Voltei pra debaixo do meu cobertor de plumas caídas.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Mancha preta no labirinto

Estávamos numa espécie de grande pátio, do qual desprendiam-se salas uniformes, ou uma só sala que se multiplica em minhas lembranças. O lugar encontrava-se em estado de sufocamento, muitas pessoas preenchiam os espaços e se sentavam em bancos vindos do chão. As pessoas, cujos olhos eu não conseguia ver, balbuciavam constantemente, eu tinha quase certeza absoluta que eram loucas e que aquilo era um hospício. O motivo da nossa estadia era desconhecido e eu não ligava. Podíamos estar alucinando, e quem sabe para eles eu fosse apenas um vulto como eles eram para mim. Todos estavam distantes, e eu não conseguia perceber quais eram vocês. Sei que Will estava longe, encostado numa parede, como que à espera de alguma coisa. Meus passos disléxicos e avoados não cessavam. Fui, então, surpreendida por um ato lúcido de ódio infundado. Um homem velho, grunhindo, arrancou uma faca reluzente do bolso das calças pastéis e marchou em minha direção, apontando-a diretamente para meu rosto. Will postou-se à frente e repreendeu o velho com palavras sérias, fazendo-o desistir e se deixar levar por seu déficit de atenção que lhe mandava caminhar em outras direções. Will não trocou uma palavra comigo antes de voltar para sua posição de guarda, e isso refletiu-se em minha palidez. Mamãe saiu correndo a reclamar pela porta da frente, que, de repente apareceu, aberta, na parede central do pátio abarrotado. Subitamente, eu havia sumido.
Apareci no que deveria ser outro lugar no mesmo prédio ao qual o pátio pertencia, ou num corredor qualquer do labirinto do meu inconsciente. Completamente sozinha dessa vez, ousei passos vagarosos. Deparei-me com um cômodo, por vezes grande, por vezes pequeno, de uma iluminação brilhante, afosca, transparente. Entrei e vi bancos de igreja cristalizados, o suposto altar não vi, apenas os assentos grotescamente bonitos. Um princípio de escada cresceu da cerâmica próxima a meus pés. Um amigo mago veio, sorrindo, não sei de onde, sentou-se na escada e eu me juntei a ele. Saíram de sua boca algumas palavras fortes, e a inércia da sala morta se rompeu, o ferro da escada em espiral foi surgindo, e quando notei estávamos tão alto que quase atingíamos o teto. Deu-se uma festa silenciosa celebrada por pessoas invisivelmente perceptíveis que nos rodeavam. Um leão sem corpo apareceu, e num rugido de desespero me trouxe de volta ao plano físico e mundano do meu despertador.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Domingo

Ruído inconsciente, real e sonolento. Janela, bom dia, casaco cinza e cara de baunilha. Croissant com geléia de amora e café com samba. Cortina rosa perto das notícias no rádio. Antares, a estrela maior que o sol e o lugar das antas. Guitarras que hipnotizam e palavras. Desenvolvimento musical pessoal. Abraços fraternos, caminhadas e sustos. Atos de gente livre repletos de simpatia alheia. Nostalgia, graças. Moeda e pedido na rosa de John Lennon. Fotos de gente que fez história. Canto despreocupado movido por instrumentos vivos em meio a gente que não entende. Linhas invisíveis que dividem coisas flutuantes e sem parâmetro. Investimento espontâneo sem mágoa. Cheiro ilusório de chuva. Pressentimento enganoso e psicológico. Sorriso que compensa tudo, tênis com detalhe azul. Esquerda e direita de difícil remoção. Castanha. Árvores e luzes estratégicas, lago e luzes refletidas. Compreensão mútua, conversas. Carinho e cappuccino, batata frita e molho de queijo. Conclusões surpreendentes, câmera invisível e astrologia. Completude. Tempo, barata, boa noite. Chocolate. Bloco de notas, ainda não terminou.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Caminhando por extremos

Uma quietude observadora repentinamente tomou conta dos olhos dele. Todos, seres hipoteticamente inanimados, lançavam sorrateiros sorrisinhos por aí afora, indiscriminadamente. Eles pareciam felizes, pensou. Felizes de uma fingidez individualista, muito consciente e incrivelmente contraditória. Passos lentos, sentidos atentos, senso de percepção incomum. Luzes acesas e luzes apagadas nos cérebros de todos eles, o hábito de acendê-las e apagá-las. A parte mal iluminada, devagarzinho, vai se tornando mais cômoda. É mais fácil fechar os olhos onde já não há luz, não há mero resquício de nada. Quando parou, percebeu que esteve caminhando para qualquer lugar durante um tempo que tropeçava entre horas e minutos. Quando se torna um número imaginário e entrega-se o máximo que conseguir ao idealismo, não se reconhece mais no mundo. É uma escolha. Transitar entre o claro e o escuro talvez fizesse sentido, se é que se pode dizer que coisa alguma o faz. Pôs uma bala na boca, estalou os dentes, sentou-se ao banco que delicadamente brotou à sua frente. Perdeu-se na fugacidade subjetiva do claro para logo se encontrar na objetividade medíocre do escuro.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Lua oposta ao Sol

Fui tomada, de repente, por um pequeno fluxo de consciência. Sempre duvidei das palavras, sempre senti falta delas como se, na verdade, nunca estivessem comigo. Eu estava andando por um longo caminho aparentemente retilíneo, cujo fim ou ausência dele eu não podia perceber. Meu corpo físico movia-se enrijecido pelo espaço, aquele lugar onde a Terra deitava, adormecida, brincando com o tempo sem se importar. Estava frio, era a falta de você. A Lua, pregada ao céu, límpida, redonda, fosca, com uma magnitude sombria e mística, transparecia uma incompetência inexplicável. As cores misturavam-se atrás dela, tornando-se uma coisa só, maleável, de uma profundidade incontestável. Oposto a ela, numa precisão assustadora, o Sol brilhava de um brilho cego, superior, infinito. A luz da manhã nunca me dá fotofobia, a sensação de uma coisa que cresce, não só no céu, mas dentro de mim, é confortante. Eu, por segundos esgotáveis, estava no centro do Universo, era ele que estava ao meu redor, estava inserida nele egocentricamente, como se minha alma e tudo que a acompanha fosse maior. Talvez seja. Nós estávamos virados de cabeça para cima. A Terra, daquele pequeno ponto sem dimensão, estava conectada a duas forças grandes demais para ela, tão grandes quanto o que prende nossos pés ao chão. A fluidez desequilibraria a situação, como é de se esperar. Viramos, e então meu caminho se inclinou e me deparei com um penhasco pelo qual deveria despencar. Continuei, sentindo algo não me deixar sofrer uma queda brusca e mortal. A Lua é transformista. Estou cercada de consciências muito mais deslumbráveis do que pequenos fios prateados que atravessam pedaços sólidos de mim, no início e no fim do dia.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Parte microscópica da problemática

Bruna sempre havia sido uma sonhadora, daqueles tipos caóticos e bonitos, que vivem a olhar as estrelas de pernas pro ar. Quer dizer, não de pernas pro ar, "o vestido vai descer!", matracava seu pai, careca e resmungão. Calça, nem pensar, menina era feita pra usar vestido, pra casar e pra aprender os pontos de costura. Afinal, "a mulher nasceu do osso torto de Adão, e alguém que nasceu de um osso torto jamais pode se endireitar", já diziam os padres metidos a sabichões. Bruna cresceu ouvindo tais barbaridades e represálias, e as tão desejadas asas de voar ficavam sempre presas em sua imaginação encantada. Liberdade era algo muito distante da realidade do mundo, e não só do mundo de Bruna, mas do mundo mesmo, aquele que gira sem parar ou que para sem que notemos. Ainda bem que gira e que é discreto em suas fugas do dever de girar. Quem sabe o movimento rotatório da Terra ou a falta de percepção da falta dele dê uma chacoalhada nas idéias ordinárias e limitadas do pai de Bruna e faça com que elas escorram-lhe pelos ouvidos e permitam-lhe, quem sabe, que deixe de separar seres humanos de demais seres humanos. Caso contrário... A vida de Bruna se tornará efêmera, triste, tudo ficará ali do lado de fora, esperando pela mente brilhante do indivíduo único e criativo que nunca virá e que se perderá na eternidade.

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Fio de pensamento

São infinitos pedaços de magia colorida zunindo, voando, se interligando, num só laço. Movimentos sutis, sedas intocáveis, espectros hipnotizantes. A cor é minuciosa e escrupulosamente específica, bonita por natureza. Cada uma dessas cores deve, num determinado momento de tempo e espaço, se tornar transparente e ser, por completo, parte do universo maior. Isso tudo é o Grande Esquema. Tudo, os seres vivos, as coisas, os sentidos, os momentos, cada um deles, tudo planejado, cada um dos pedaços de espectros. É o caminho. Existem contradições muito grandes num mesmo self, e isso é admirável. Quando mais árduo o caminho, maior a porcentagem de transparência adquirida. São muitos os estados, as influências.
A transparência, em todos os seus estados físicos e não-físicos, é o amor.
Essencial: ver com olhos maiores que os seus.

terça-feira, 23 de junho de 2009

Caleidoscópio

Tudo é simultaneidade. Gaia é uma parte de tudo que, supostamente, existe, parte de todas as coisas fora de alcance. Dentro de um Universo infinito ou não, é uma bola de sinuca. Existem nela doses não comprimidas de surrealismo, uma grandeza imedível e mágica. Cada fragmento de alma, em seus estados profundos e mutantes, no fim fazem parte de uma mesma energia, é uma alma só. Todos os planos, lotados de especificidades inimagináveis, fazem parte. Maya existe, mas toda ela existe numa só coisa que carrega consigo lágrimas e risos, manifestações. Somos instrumento de manifestação do Universo e do que vai além dele, da coisa alguma ao ponto sem dimensão. É como uma poeira invisível, porém sensitível, que envolve a nós e tudo ao nosso redor, queira nos façamos sensitivos a ela ou não. É apenas parte, e, ao mesmo tempo, você e eu somos todas as galáxias, poeiras cósmicas e a flor rara de um lugar inexistente apenas para nossos olhos. É único e uno.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Piece

Once there was a boy who didn't exist, but had deep on his mind and heart all the dreams of trees and blue birds, growing and flying, and swimming and dieing. The cats crowled through his legs, and he didn't cry.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Diante das circunstâncias

A mistura congelante de gases de cinco da manhã fez com que eu me encolhesse por debaixo das cobertas, sem vontade alguma de deixá-las, embora uma voz próxima me anunciasse minhas obrigações. O sono inexistia, a sonolência não. Levantei atrás de uma meia para aquecer os pés.

Era tarde, parei frente aquela enorme janela, subi na beirada dela, estagnei. Nunca vi tantas cores juntas num só céu. Tonalidades e degradês brincavam com meus olhos, minhas piscadelas eram lentas e atordoadas. Os formatos caóticos das nuvens velhas e esfumaçadas davam forma à um desenho abstrato, borrado por um estojo inteiro de tintas. O tempo... O tempo ia passando sem se perder. Por fim, só coloquei uns sapatos e escovei os dentes.

A sanfona e a voz, espontâneas, a neblina que cobria a cidade inteira, o sol, o céu, o lago. Faltou-me o vestido, eu estava num sonho nunca antes sonhado. Submergi no céu, a branquidão era o tudo - ou o nada. A sensação curiosamente não amedrontante de estar próxima à queda de um penhasco infinito era constante, até o despertar. Acordei assim que o carro saiu do projeto de nuvens novas que tocam o solo.

Café com creme fresco do leite fortemente emulsionado, ligeiramente açucarado, de François; pessoas. Pequenas impressões, grandes conclusões.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Cheiro das flores da ilha

Os neurônios estão interligados, realizando rápidos e imperceptíveis, entretando essenciais movimentos sinápticos. Reações químicas, diminutas, dinâmicas. Energia sendo transportada por dentro, aparecendo por fora. Lapsos, consciência, impulsos nervosos num perigoso e frágil equilíbrio. O erronãonecessariamenteerro é facilmente difundido. Alguma coisa pode ir fatalmente mal, e essa coisa provavelmente dependerá de influências de outros tantos cérebros, cada qual com seus próprios sentidos abstratos e inconsciência indecifrável, ilocalizável e impenetrável.
Erros de alguns neurotransmissores e pontes neuroastênicas nomeados por petulantes possuintes de telencéfalos altamente desenvolvidos e polegares opositores podem ser emoldurados por nossos muitos eus-líricos. Alma refratada e refletida em múltiplas micropersonas. Interação de pós e partículas, cores, sons, pequenos movimentos contornados, num mesmo plano. Emissões, transmissões, correspondências, trocas, criações. Os estados de espírito imutáveis, excitados por outros, provocando as tais perigosas reações psicoquímicasfísicasbiológicasfilosóficas não-cientificamente comprovadas, mesmo que pareçam ser. Teoria do Caos.
Uma borboleta, que não é um ser humano, mas que, aos olhos de uma garota possuinte de um telencéfalo altamente desenvolvido e um polegar opositor, é amarela, sobrevoa a grama supostamente verde e provoca um movimento brusco no balanço do vestido supostamente azul de sua observadora. O som do carro dirigido pelo polegar opositor de um homem qualquer, que freia ao ver a garota azul, provoca sentimentos jamais compreendidos num equivocadamente considerado mais importante ser humano que os outros que transitavam por ali, e tais sentimentos o levam a pensar. Pensamentos e faíscas neurocósmicas o fazem realizar ações não previstas em buscas de prazeres mundanos extremamente individualistas que, num outro tempo, talvez próximo e talvez distante, dilacerarão ciclos de vida e correntes sinápticas de outros seres humanos, supostos companheiros de viagem.
Em busca de objetivos contraditórios e pouco pragmáticos, irreais e inventados, os paradoxalmente possuintes de telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor utilizam tais artefatos naturais para alcançar conclusões não-nobres e, por vezes, estúpidas e para fazer algo a respeito destas, esquecendo-se com provável discernimento de que outros fazem o mesmo, e que isso não funciona.
Existem coisas que não possuidores de telencéfalo altamente desenvolvido e polegar opositor também contemplam, também sentem. Sentir é a palavra. Deveria haver uma espécie de combinação simétrica entre sinapses e estes, tão ou mais importantes. As vezes desistimos de olhar pro Sol por não podermos mais enxergar todas as nossas personagens astrais, e isso é fruto de outros que fazem o mesmo com outros, e por aí deduz-se a icógnita conseguinte.
Eu e meu imaginário somos provas vivas da caoticidade concreta e mutável, admiravelmente transmutável, da natureza de uma vida. Lady Murphy, não há ninguém utilizando seus telencéfalos altamente desenvolvidos e polegares opositores para realizar menções sinápticas e combiná-las com amor, e salvar o mundo.

quarta-feira, 27 de maio de 2009

Nunca esquecer

Ergue os olhos e olha
Olha pro que não vê
Mas mesmo assim!

Ou olha
Ou deita a cabeça nas camas mórbidas,
Tóxicas,
Dos nossos desumanos companheiros de viagem.

sábado, 23 de maio de 2009

Sexta à noite, aglomerados de quase-humanos conversando empolgados por todos os cantos, uma projeção do som do silêncio era um sonho distante. Às vezes as palavras faltam, e você, numa tentativa de se expor, mostrar, sair da casca... simplesmente não expõe coisa alguma. Lua balsâmica é dia de olhar pro céu e pro inconsciente.

domingo, 10 de maio de 2009

Pragmática

Cuidado
Tomar
Pisa
Onde

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Prés e Pós

Eu gostaria de acreditar que, na verdade, emoções são joguinhos mentais pré-programados pra te fazer ter certeza que se arriscou. Sempre me dizem (eu mesma me digo) pra viver momentos, e não planejamentos. Acontece que os pósoupré-momentos acompanhados de luas balsâmicas, martes em áries e casas dozes não são de todo proveitosos, não quando o foco deveria ser, mais do que nunca, mantido. Os astros favorecem e desfavorecem ao mesmo tempo, cabe a mim centrar-me no meu costumeiro auto-controle.
Reconhecer as conexões especiais entre almas que fazem parte da minha vida é uma coisa, senti-las é outras. Solidão é a pior coisa já inventada, especialmente quando meu (grande) lado capricorniano insiste em tentar se convencer que não precisa de ninguém. Precisa. É só.
Situações fictícias somadas a todos esses adventos não ajudam. Levam-me a duvidar da minha própria essência, da qual eu tinha plena convicção há alguns dias. Ou ela é nula ou imperceptível. Se imperceptível, nula.
Eu não sou um rostinho bonito.

Não vejo porque me personificar e enfeitar uma história que, de qualquer modo, vai continuar sendo a mesma, real e indubitavelmente confusa.

domingo, 26 de abril de 2009

Pedaço

I know it is here. The essency. I feel it, I feel it for real, I'm just not sure if someone else does. They don't. That gives me a sad certainty.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Única verdade

Tudo começa quando começa. Para algumas pessoas, o começo é o despertar, a saída do mais próximo que jamais chegaremos de nossos vacúolos temporais.
Ludmila (todos os nomes do mundo são bonitos, basta um leve esforço pra vê-los de formas distintas, sem influências maléficas do nosso querido senso popular) abriu com suavidade seus olhos amendoados, forçando algumas remelas a se despregarem com seus cílios desprivilegiados. Alguns miados familiares. O quarto estava mal iluminado, a consciência dos afazeres e dos problemas a resolver lhe inundou, o que não a deixou nem um mínimo sequer atordoada, não a tirou de seu estado sublime. Suspirando, moveu seu corpo lentamente, fez alguns alongamentos recomendados pelo gordinho da Women's Health, levantou sem forçar a coluna vertebral. Pôs os pés no chão frio. Serena, saiu andando com completo equilíbrio e auto-controle, meio cega pela falta de luz, desviando de todos os sapatos espalhados pelo quarto afora, papeis de roteiros embaralhados por todo o cômodo, Nana e Liza, que caminhavam pacificamente com seus focinhos a farejar e rabos a balançar, atrás de algo interessante. Abriu o armário, vestiu qualquer coisa, calçou um dos sapatos largados pelo chão. Daí, o ato de glória;
Satisfeita, expondo para si mesma um singelo sorriso amargo, escancarou a janela do quarto, que ia de parede a parede, e, quase que instantaneamente, lotou o quarto antes escuro da luz pura do dia novo. Miados, uma respiração longa e profunda. Ludmila olhou corajosamente para o dia lá fora. O motor dos carros a rosnar, feio, foi sufocado por um bem-te-vi que cantava bem ali perto. As nuvens, formando complexas formas indecifráveis no céu, embelezaram essa complexidade toda com sua branqueza simples. E o ar pareceu ser a resposta mais óbvia de toda e qualquer pergunta já existente.
Deixou a janela e trotou com confiança até a cozinha, tomou um copo cheio de leite geladíssimo, sem adicionais. Fez um carinho nas gatas, beijou-as, deixou escapar um desnecessário "amo vocês" e lançou uma ultima olhadela para o apartamento.
Com um largo sorriso, saiu de casa com a única certeza que lhe consumia todos os dias. A certeza de ver aquela coisa, e de poder fazer seus chamados amores verem-na também.

domingo, 12 de abril de 2009

Pedaço

De repente, as coisas ficaram incertas. Ele ficou ali, ao lado do sinal, à espera de um olhar que lhe mostrasse a direção. Gastou quase todos os seus neurônios mentais e quase todos os seus minutos de todas as suas últimas três, quase quatro semanas. Ignorou todo o movimento dos transeuntes ao seu redor, suas vidas não lhe faziam sentido algum. Resolveu, quase que espontaneamente, sentar-se ali, bem ali na calçada dura e recém cimentada. Não ligou. Abaixou a cabeça e se auto-absorveu de novo. Sua consciência latejava. Sabia o que fazer, mas, ao mesmo tempo, algo dentro de si apontava pro contrário. Segurou a cabeça com as próprias mãos e sentiu alguns chutes alheios de pessoas que passavam por ali e não reparavam na sua existência.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Undeniably

Some people are different. Some of them have awake inside things that others have asleep. I have always, since I was born, had a feeling wild and uncontrollable. An unexplainable feeling, enormous, endless. And always had a will, a wish to put it out. A wish to love, to love all days, all minutes, all the time. I look at things and don't see them with the same eyes. Out of nowhere, it came to me, and now, today, I've realized that the chance is right in front of me. You'll not suffer anymore. The world will be bad to you no longer, I'll make you feel the tree and the sun. You'll not feel mad and angry, I'll make you look at the bird, I'll make you smile for no reason at all, and you'll cry, for sadness no more, but because you find it beautiful and deep. You'll never have to be who you're not anymore, you'll be you, and nobody else. I'm willing. It's for you. My love is going for you. If I don't do it, probably no one will, for the rest of your life. I can not admit that, you can not die without have witnessed it all, it's wonders, it's magic. You're broken when your heart's not open, and I'm going to open it, because I can and because I want to. That makes me happy, and so will you. My love is yours.

Human.

terça-feira, 31 de março de 2009

Inquietação

Exausta, sentou-se na cadeira de pensar. O Sol esquentou suas pernas. Ela não tinha mais que ser borrada. O resto não deveria ser parâmetro para nenhum desenvolvimento individual. Ela não precisava olhar apenas para o próprio umbigo, podia olhar para o próprio cérebro. Havia sabedoria dentro dela para desenvolver uma manifestação, provocar manifestação nos outros inquietos que a cercavam. E não eram muitos.
O humano, programado, perdeu dentro dele mesmo o humano, e só ele mesmo pode encontrá-lo. Ela estava se encontrando. Os poucos tinham que se dobrar, e o dobro se triplicar, e o triplo se multiplicar. Ela podia dar-lhes um tapa no rosto, um tapa que os faça sentir alguma coisa, que os faça olhar ao redor. Parar, olhar, perceber, chorar, gritar, organizar, fazer, realizar, consertar. Parar, olhar, observar, sentir, absorver, sorrir, amar. O verde é de árvore, não é de cifrão. Todas as cores valem, e tudo que as acompanha.
Ela podia. Podia transformar o indivíduo, e os indivíduos, e o conjunto de indivíduos, e salvar todos os mundos deles mesmos e de todos ao seu redor. O ar está se esgotando, o tempo não para não. Ela podia acabar com o Despotismo e todos os ismos. A melancolia poderia esbanjar sua verdadeira beleza, assim como as crises de riso. Ela tinha que fazer ver que a idéia de felicidade não traz como significado a desimportância de tudo. As vidas, mágicas, desmerecidas por outras. Grandes e pequenos estão acabando com a terceira dimensão. Sua existência devia dedicar-se também à outras, e à existência daquilo que é maior.
Absorção de energia cósmica, naquele momento. Suas mãos deveriam salvar tudo aquilo cujo ser era reconhecido.
O conjunto está sendo errado, desde o momento de sua criação. "Você não o único indivíduo deste universo, e o conjunto de seres humanos não é dono dele", disse ela ao público de insetos que a assistia pensar.

terça-feira, 24 de março de 2009

Escapando pelos dedos

Os ponteiros marcam 12 horas e 53 minutos, o Sol não brilha. Longe da cama, meu corpo desgastado reclama silenciosamente, repuxando músculos aos quais eu não reconhecia existência. As palavras imersas nos livros abertos deveriam fazer sentido, mas a incoerência e os devaneios prevaleceram, me afastando por completo do mundo físico.
Havia alguns sorrisos dos quais eu não conseguia me lembrar com clareza, e isso me aborreceu. Incômodo silêncio. Aqueles determinados jeitos peculiares de andar, falar, comer, olhar, abraçar... Fugiam-me. Meus sentimentos não têm memória.
Biologia não fazia sentido, a lembrança da textura da sua pele me acalentava. Fechei os olhos, deixando os irrevogáveis paradoxos me dominarem. Introspecção oposta à saudade de corações humanos, DO coração humano.
Repentinamente, eu tinha cabelo branco. O café e os papeis diplomáticos a minha frente não tornavam o clima mais ameno, estava frio. Minhas pinturas tinham se perdido com o tempo. Não vi o Sol, não vi a grama, não vi o orvalho na manhã de domingo, não vi os olhos expressivos que me olhavam. Suddenly, I was fifty and alone.

quarta-feira, 11 de março de 2009

Tentativa Culinária

Afirmação dezessete ridículo você de repente
Meu perguntei etnemlanif que tinham pois
Continuou copas querido própria
Terrível precisa Ródanon duas eles

Motivos
Revela
Oloria
Preocupava
Esfinge junto ensinar-lhes pensei
Anões pois enigma
Sem bem sob disse meus.

domingo, 8 de março de 2009

luzAzul

Há o reflexo dos Azuis no lago.

1 azul, 2 azuis, 3 azuis.
O olho do observador.
Ele observa.

10 azuis, 100 azuis, 1000, 1332 azuis.
Gira, gira, passa, passa.
Não define.

Cai o ponto no lago de cima.

Desce o azul, os azuis, ziguilhões.
Cada azul
Complexo.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Pedaço

A janela aberta me chama. Caminho até ela, sentindo dores musculares inconvenientes. O Sol não está forte, permitindo-me porver através do buraco quadrado de minha parede.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Inspelho

As estrelas têm poderes mágicos e inimagináveis, e tudo que as cercam. As relações entre elas e entre o infindável infinito impossivelmente figurado. Sábios dizem: uma coisa é espelho da outra. Pessoas e universo, ligados por uma corrente grossa e inquebrável. In. Interno.
Quando subjetivo se opõe à objetivo, passado se opõe a futuro, berço se opõe a destino, sentimentos se opõe a metas, complicações surgem num rápido movimento de olhos. Palavras ajudam, mas são sempre poucas, nunca dão total liberdade aos anseios de um coração que toma direções distintas.
Tudo isso gera uma força enorme que não se sabe ao certo de onde vem, e uma determinação incrível. Capacidade de peitar transformações, por mais fatais que estas sejam, e situações inconvenientes e absurdas.

And love... love makes a smile be easier to break free then it could possibly be.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

ANAGSO

As normas atuais geram soluções oftalmológicas.
A nova apresentadora gosta sim, Osvaldo.
A neurologia acidental gera só ósculos.
Arnaldo nunca aspirava gotas sudoríparas originais.
Assim não acontecem giratórias super ovais.
Arrisco não amar Gustavo só ontem.
As náuseas acarretam gotas sebosas ovarianas.
Arisco no assado gostoso soluciona objeções.
Assim não aceito, gaganhão seqsy oi.
Até netos analisam geriatricamente senhor Odemar.
Antes Norival amanhecia gritando socorro ostras.
Arrasado, Nildo amarrou gazelas sobre ornitorrincos.
Arnaldo notava antas gordas sentindo orgasmos.
Alimentar narinas acalmava Gertrudes Silva Oliveira.
Avestruz nostálgica ansiava gritando sobre ovos.
Alces nunca amaldiçoam gordas sem olhar.
Açougueiro neurótico arma gangue sádica ofegante.
Amoras no altar gritam superficialmente orações.
Astronautas não aceitam giletes sobrevoando oceanos.
Artistas nunca acrescentam gordura sem opiniões.
Avistamos nádegas adiante gritando sem ofender.
Antigos navegadores amavam gim sem oliva.
Abacaxis naturalmente amarelos garantem sedução objetiva.
Antecedentes notam arranjos geralmente suspeitos onipotentes.
Artigos notificam amores, gozeis sem olhar.
Aborígines nus andavam grunhindo semivivos ontem.
Alcoólatras nativistas andróginos gargalharam sem osmose.
Admitir nadadeiras alavancadas gera sonolência ótica.
Águias narcóticas atrapalham gaivotas sedentas obliquamente.