Era uma segunda-feira com jeito de domingo. Despertei de um sonho mal dormido com uma sensação borbulhante de febre e dores corporais. O almoço estava quase pronto e saco vazio não para em pé - não que eu fizesse questão de sustentar meus ossos pesados sobre forças fracas.
Limpei o envelope, esfreguei o cérebro com sabonete para peles sensíveis, a água me escorreu azul. Saí acompanhado de alguém que me transferia uma dureza útil, porém amarga e cansada. Ainda assim, acariciava-me a mão com a sua. Dicotomia engraçada.
Chegamos, encontramos um sujeito que me era conhecido e sentamos a esperar entre conversas envergonhadas e sem sentido. Nada fazia sentido.
À medida que o tempo se arrastava, meus motivos iam tentando me escapar pelas esquinas. Reclamação, impaciência, incômodo, dúvida. Ali, a única coisa que me envolvia firmemente era a angústia; o resto descia pelo ralo como a água do chuveiro que havia a pouco me lavado.
Fui, então, na súbita ausência de uma alma que me acompanha por toda a vida, chamado. Entrei, prepararam-me. Era um ritual de passagem. Sentei-me em posição fetal, e então a fragilidade do mundo modificável de uma criança para nascer me tomou por completo. Meu corpo estava sofrendo uma segunda moldagem, dessa vez presa a uma inerente e amadurecida dor. Sofri. Repeti minhas razões por efeito, conversei comigo mesmo. Senti duas mãos presenciais tocando-me, fazendo misturar-se energia humana e energia naturalmente artificial.
Sangue e suor, acabou. Levantei-me tonto e cambaleante, vi meu reflexo e sorri um sorriso de três metades: metade intrigado, metade questionador, metade aliviado. Estava agora, sob minha pele em tinta preta, a concretização da realização.